19 de abril de 2011

O carreté do coroné (Manezinho Araújo)

GRANDES BRASAS DA HISTÓRIA

Brasa de 1939!!


O carreté do coroné (Manezinho Araújo)


Seu Coroné comprô um automovi
Que todo dia sobe na ladeira do Migué
Seu Coroné comprô um automovi
Que todo dia sobe na ladeira do Migué


Tem um espeio que só à luz do dia
Pode sua famia passeiá quando quise
E o carreté imbolando pelo chão
Eu vou é trabaiá no caminhão do coroné


Seu dotozinho comprou um carro forte
Otra coisa mais mió garanto que ele não qué
Seu dotozinho comprou um carro forte
Otra coisa mais mió garanto que ele não qué


Quando ele chega e si dana lá pra usina
Apertando a buzina enche o carro de muié
E o carreté imbolando pelo chão
Eu vou é trabaiá no caminhão do coroné


Lá na usina chego dois caminhão
Qui carrega da estação cana modi faze mé
Lá na usina chego dois caminhão
Qui carrega da estação cana modi faze mé


Seu dotozinho carrega a mulé dos homi
Tá bancando o lobsomi tendo o carro chevrolé
E o carreté imbolando pelo chão
Eu vou é trabaiá no caminhão do coroné


Seu Tolentino que é chefe de um angá
Deu a fia pra casá ao fio do coroné
Seu Tolentino que é chefe de um angá
Deu a fia pra casá ao fio do coroné


E todo dia ele pega o seu amô
arremexe no motô ensinando a ser chofer
E o carreté imbolando pelo chão
Eu vou é trabaiá no caminhão do coroné


Doje por diante vo largá o meu emprego
Por causa do chamego do dotô com essas mulé
Doje por diante vo largá o meu emprego
Por causa do chamego do dotô com essas mulé


Esses passeio nesses carro no escuro
Isso é negócio duro só mesmo quem tem ané
E o carreté imbolando pelo chão
Quero ve quem trabaia mais no caminhão do coroné...

10 de abril de 2011

Fotos: Paulinho da Viola no Sesc Pompeia


Fotos: Marcelo Martins

Paulinho da Viola, o casamento entre a elegância e o samba

Que grande prazer é poder conferir um espetáculo de Paulinho da Viola, gênio da música mundial contemporânea, exemplo de vida e de serenidade. 

Sambista de respeito, chorão de primeira categoria, padrinho e idealizador da Velha Guarda da Portela,  compositor de partido alto e samba enredo, Paulo César Batista Faria, nosso ministro do samba, um dos maiores. Há 15 anos sem gravar um disco com sambas inéditos, ainda pode nos brindar com apresentações memoráveis. 

Nesta última sexta-feira, no Sesc Pompéia, fez um inesquecível show, interpretando um repertório "lado B". Quem era fã, se deliciou com sambas que jamais sonhariam ouvir num concerto de Paulinho da Viola.

No acompanhamento, estavam músicos acostumados a tocar com Paulinho em palcos e estúdios há tempos. Foi um grande prazer poder ver e ouvir Cristovão Bastos, excelentíssimo pianista e arranjador de dezenas de sambas do grande portelense. 

Hércules, na bateria, também mantém a mesma elegância que caracteriza Paulinho da Viola. Aliás, o conjunto todo carrega esta elegância "à la Paulinho da Viola": Celsinho Silva faz carinho no pandeiro quando toca, Mário Seve, nos instrumentos de sopro, dá um toque sutil e refinado nas canções e João Rabello - o filho -, aos poucos vai ocupando bem o espaço que foi por décadas de César Faria - o pai-, este sim, aquele que ensinou tudo de "elegância musical" para Paulinho.

O belíssimo repertório - parecido ao que ele apresentou no Teatro Fecap em 2010 - trazia sambas de compositores da Portela (Zé Keti, Monarco, Chico Santana, Noca, Mijinha) e da Mangueira (Cartola, Carlos Cachaça, Nelson Cavaquinho), exaltação ao seu bairro, Botafogo e a seu parceiro, Elton Medeiros. Trouxe um samba de Valzinho (com Peterpan) e parcerias com Capinan e, como não poderia de ser, com o próprio Elton, o mais constante deles.

O início se deu com o belíssimo samba "Portela Feliz", de Zé Keti, aquele que acrescentou o "da Viola" a seu nome, ainda nos tempos do Zicartola, nos anos 60. Sob um silêncio absoluto, Paulinho e seu cavaquinho - e  nada mais - abriram o espetáculo já mostrando qual seria a linha da apresentação: só peso na balança!

Depois, seu bairro foi louvado com "Botafogo, Chão de Estrelas", parceria com Aldir Blanc. E dá-lhe sambas  lado B, pouco conhecidos e interpretados nas rádios ao longo das décadas, mas de extremo valor (e que honra por ouvi-los em uma apresentação ao vivo). "Brancas e Pretas", Cidade Submersa", Vela no Breu", "Orgulho", clássicos de pouca popularidade. Diferente de "Ame" e "Quando bate uma saudade", na ponta da língua dessa Brasilão afora.

"Um cara bacana", é uma homenagem a Elton Medeiros, mais que justa, numa interpretação garbosa, com piano, violão e tamborim. "Elton Medeiros, orgulho do samba do Brasil!". Paulinho também lembra de Ciro Morteiro quando canta "Pintou um Bode". "Fiz este samba pensando nele. Pensava nele cantando esta composição", lembrou.

Paulinho da Viola transpira serenidade. Traz sempre consigo um semblante tranquilo, calmo e alegre. Estava à vontade no palco do Teatro do Sesc Pompeia. Lembrava dos velhos amigos e de seus inspiradores. Um deles é Valzinho, autor, com Peterpan, de "Tudo foi surpresa". 

Capinan, grande letrista, também foi lembrado em "Canção para Maria", uma bela parceira com as melodias de Paulinho, que relembrou seu primeiro encontro com o compositor baiano e o nascimento da canção: "Ele chegou até mim e me disse: 'Eu sou Capinan, e queria fazer uma parceria com você'". A música tirou o terceiro lugar no II Festival da Record, e foi à cera num disco de Jair Rodrigues e num compacto raro de Paulinho. "Só eu devo ter este disco", apostou.

Os músicos estavam felizes. Nada de tensão, nada de preocupação em não errar. Eles sabiam o que estavam fazendo, não iriam errar. São músicos experientes e sambistas. Aliam a criatividade do improviso à disciplina que se deve ter para ler as partituras com os arranjos com exatidão no palco. Todos, exceção feita a João Rabello, tinham a cabeça branca, de quem já tomou muito sereno em rodas de samba e choro. Isto chama-se experiência.

Outro ponto alto do show foi a interpretação do choro "Inesquecível", mais uma homenagem feita por Paulinho presente neste espetáculo onde ele relembra grandes nomes que influenciaram sua carreira. Desta vez as honrarias são para Jacob do Bandolim. Cristovão Bastos e Mario Seve, piano e sax, levaram a plateia à emoção.

A Portela também foi bem lembrada. Além do samba do Zé Keti que abriu o show, Monarco e Chico Santana ("Lenço"), Noca ("Peregrino") e Mijinha ("Chega de Padecer") estiveram representados. E sambas  da Mangueira consagrados não ficaram de fora. "Não quero mais amar a ninguém" (Cartola, Carlos Cachaça e Zé da Zilda) e "Não te dói a consiência" (Nelson Cavaquinho, Antonio Garcez e A. Monteiro), duas pérolas.

No fim, cantou "Boiadeiro" (folclore) para Fernando Faro e, à capela, mais uma vez sobre um respeitoso silêncio sepulcral, fechou com "Tava Drumindo". Deu pra sentir a presença da Rainha Quelé. A emoção foi geral.

No bis, a platéia já estava sambando. Era o "gran finale" de um espetáculo digno da grandeza de Paulo César Batista de Faria, nosso grande Paulinho da Viola, grande mestre da cultura brasileira.

Avaliação: ***** (espetacular)

7 de abril de 2011

Paulinho da Viola no Sesc Pompeia

Paulinho da Viola, gênio da música brasileira, se apresenta neste fim de semana no Teatro do Sesc Pompeia. Os ingressos se esgotaram rapidamente. Nesta sexta-feira estarei lá e depois deixarei minhas impressões aqui.

4 de abril de 2011

Samba de Sambar do Estácio (Humberto Franceschi)

(Publicado originalmente na edição 631 da revista Carta Capital)


Escrito pelo pesquisador musical Humberto Franceschi e editado pelo Instituto Moreira Salles, Samba de Sambar do Estácio - 1928 a 1932 é um estudo sobre um período de fundamental importância na história da música brasileira: a transformação do samba amaxixado em samba batucado.

Os sambistas do bairro carioca do Estácio de Sá, dotados de grande sensibilidade musical, foram os responsáveis por esta mudança. Nomes como Ismael Silva, Heitor dos Prazeres, Bide, Nilton Bastos, Baiaco, Brancura, Getúlio Marinho, Bucy Moreira, Mano Rubem e Mano Edgar criaram um novo ritmo, com andamento mais acelerado, cadência mais marcada e grande riqueza melódica. Feito na medida para ser cantado no desfile de carnaval. Era “o samba de sambar”, que em nada lembrava o velho maxixe.

Contando com valiosos depoimentos de alguns remanescentes do grupo, o autor também se vale de sua grande coleção de discos em 78 rotações por minuto para analisar a obra destes compositores que, num curto espaço de tempo (apenas quatro anos), mudaram o formato do ritmo que se estabeleceria em pouco tempo como o mais popular do país.

O texto, crítico e direto, traz elucidativos capítulos sobre temas relevantes do universo mítico do samba como os desfiles na Praça Onze, as rodas de batucada, os encontros nas casas das tias baianas, as Festas da Penha, o surgimento e o desaparecimento da Deixa Falar (primeira escola de samba) e a relação destes sambistas com a prostituição, o jogo e a valentia. Para amarrar melhor as idéias, a edição traz ainda um DVD multimídia com fotos, depoimentos, músicas e um mapa da região datado de 1935.

O prefácio é assinado por outro “bamba” da historiografia da música brasileira, José Ramos Tinhorão. E cabe destaque o levantamento inédito da obra gravada dos compositores do Estácio, com grande riqueza de informações.

Trata-se de um grande documento de estudo do samba, com dados de quem não só estudou, mas conviveu com alguns destes importantes personagens na construção da música brasileira.

Avaliação: ***** (excelente)


Samba de Sambar do Estácio
Autor: Humberto Franceschi
Editora: Instituto Moreira Salles
Ano: 2010
Preço sugerido:  R$ 50,00
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