26 de abril de 2010

A Velha Guarda de São Paulo

Há muito tempo, as escolas de samba deixaram de ser o verdadeiro lar dos sambistas e ingressaram num profissionalismo selvagem que exterminou a espontaneidade musical e artística daqueles que realmente cultuam o samba. Verdadeiros baluartes das Escolas e aqueles que mantêm a tradição de um tempo o samba era o que movia a Escola, os sambistas da Velha Guarda estão cada vez mais deixados de lado nas agremiações. Em São Paulo, surgiu em 2006 um movimento para barrar este processo degeneratório: a Associação Independente Cultural Velha Guarda do Samba do Estado de São Paulo. Na última terça-feira, dia 20 de abril de 2010, tomou posse a segunda diretoria, tendo à frente, na presidência, o senhor Carlos Alberto Caetano, o lendário Carlão do Peruche, um dos maiores do samba paulista e brasileiro.

A solenidade se deu no salão nobre da Câmara Municipal de São Paulo, num ambiente suntuoso que em nada lembrava os porões e malocas que os antigos sambistas da Paulicéia sambavam. Os pavilhões das Velhas Guardas de diversas agremiações estavam bem postadas no canto direito da sala. Era uma grande reunião de velhos bambas, todos elegantemente trajados com ternos das cores de suas Escolas. Tal evento contou com o apoio dos vereadores Jamil Murad e Netinho de Paula, ambos do PC do B. Além deles, outras “autoridades” estavam presentes. Mas quem era autoridade de verdade mesmo ali eram os sambistas.

Há um provérbio africano que diz que quando um idoso morre, leva com ele uma biblioteca de conhecimentos. Ontem havia muito mais do que várias bibliotecas. Com tamanha reunião de bambas, quantas horas de samba inéditos e espetaculares poderíamos ouvir? A Velha Guarda é a resistência.

O hino nacional foi executado ao som da bateria-mirim da Peruche, com cavaquinho e violão. Pela primeira vez, vi os brasileiros balançando o corpo no momento da execução de nosso tão belo hino. Duda Ribeiro, uma das embaixatrizes do samba paulista e lendária pastora da Camisa Verde e Branco, discursou e clamou: “Bereré!!!!”, que em iorubá significa “paz, saúde, amizade, energia”.

Carlão do Peruche, esta lenda viva do samba, ao receber seu diploma de presidente da Associação, fez duras críticas ao atual formato do carnaval e às diretorias das Escolas de Samba. “O Carnaval que eu conheci era do povo. As pessoas se fantasiavam, brincavam. Hoje é tudo negócio e as diretorias dão cada vez menos valor para nós da Velha Guarda”. De fato, há muito que se fazer para valorizar estes senhores e a criação da Associação vem para mudar este quadro.

Era chegada a hora de toda a nova diretoria tomar posse. Enfileiraram-se os pavilhões para que os bambas pudessem passar por este corredor e então receber o diploma de posse. A nova diretoria tem como principais nomes:

Presidente: Carlão do Peruche (Unidos do Peruche)
Vice-presidente: Humberto Bonfim (Vai-Vai)
1ª Secretária: Maria Cristina Nunes Martins (Unidos do Peruche)
2ª Secretária: Maria de Lourdes Ribeiro (Barroca Zona Sul)
1º Tesoureiro: Paulo Santana Vangrelino (Vai-Vai)
2ª Tesoureira: Maria Helena Rosalino (Camisa Verde e Branco)

Após a cerimônia de posse, a bateria mirim da Peruche e os sambistas presentes cantaram o “Tributo a Velha Guarda”, belíssimo samba de Fernando Penteado. Um momento mágico, a consagração do samba num palco pra lá de nobre.



Tributo a Velha Guarda (Fernando Penteado)

Quem é?
Que guarda a memória do Samba?
Quem é?
Que faz do Samba o seu viver?
Quem é?
Que o Samba é seu sobrenome?
Quem faz o Samba germinar?
Quem é? Quem é? Quem é?

É a Velha Guarda seu moço
É a Velha Guarda seu moço
É a Velha Guarda seu moço
É a Velha Guarda

São sambistas de primeira
Relicário seu igual
Essência da nossa cultura
Patrimônio nacional

Essa é a nossa Velha Guarda
A quem devemos respeitar
Graças a estes baluartes
O Samba e o mais alto patamar
(oi quem é...)!

Findada a cerimônia, conversei com Humberto Bonfim, da Velha Guarda da Vai-Vai, que me disse quais são os principais objetivos da Associação. “Buscamos valorizar a Velha Guarda. Precisamos de um espaço VIP no Sambódromo, pois nossos integrantes não têm condições de poder acompanhar os desfiles das Escolas sem uma ajuda de custo. Queremos fazer um carnaval da Velha Guarda na Avenida São João, um “avant premiere”, como se fazia antigamente, para o povo poder novamente brincar. E principalmente, buscamos um maior respeito por parte das diretorias das nossas Escolas que não nos tratam com o devido respeito”.

Fica a bronca e a esperança de que dias melhores venham para estes senhores sambistas.

Um comentário:

Anônimo disse...

O hino nacional foi executado ao som da bateria-mirim da Peruche, com cavaquinho e violão, nos conte tambem que cantou o a letra do Hino.Uma delas era a Bernadeti e as outras?

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