5 de julho de 2011

O samba hoje

Quem são estes sambistas que fazem de seus cavacos, violões e pandeiros, suas próprias vidas? O passado de glória do samba brasileiro ilumina, o presente se enfeita de melodias e um ritmo pulsante e o futuro promete cada vez mais luz à nossa maior manifestação artística e cultural.

Estamos no início da década de 10 do século XXI. Lá se vão muitas décadas desde que a turma do Estácio de Sá resolveu sincopar ainda mais o ritmo sincopado que já esquentava os bailes da cidade do Rio de Janeiro. Era maxixe, música com forte herança europeia. Era música de salão, tocada com piano e muitos instrumentos de sopro. Era um samba muito branco, europeu. Com a batucada africana, as cordas ibéricas, o pandeiro árabe e os chocalhos indígenas, um novo samba se fez. Até hoje, é esse samba que sambamos.

Veio a Era de Ouro do rádio, os instrumentos de batucada invadiram os estúdios e as rádios. Os conjuntos regionais, muitas vezes com uma batucada de Escola de Samba cheio de peso conquistou o Brasil. O tempo passou, veio o bolero, a bossa nova, o rock e o ieieiê. O samba saiu da mídia. Mas permaneceu sendo feito nos lares, bares e esquinas. Nos vagões de trem, ao voltar do batente, muitos sambistas fizeram grandes páginas de nosso cancioneiro.

Nunca morreu, nem tampouco agonizou, como certa vez se cantou. Nos anos 60, valorizou-se o sambista novamente. Foi com Martinho, Paulinho e Clara que voltou às paradas de sucesso. Altos e baixos nas décadas seguintes. Anos 80 e 90 foram de sombra para o sambista que almejava seguir a linha de um samba estaciano, com as características que foram moldadas ao longo de algumas décadas. 

Se o Cacique de Ramos introduziu novos instrumentos, alterou a síncope e apresentou novos nomes, isso é uma outra história. Afinal, o samba é dinâmico e flexível. O que é importante ressaltar é que o samba "velho", "duro", carioca do Estácio de Sá, sobreviveu às modernidades. Não, ele não foi substituído pelo samba do Cacique, coexistiu, sobreviveu e hoje está aí, mais firme que qualquer o "outro", moda nos anos 80. A moda passa.

Nos anos 90, a agonia ocorria nos meios fonográficos, mas em São Paulo se iniciou a retomada. "Mutirão do Samba", "Projeto Nosso Samba", "Samba da Vela"... Depois o "Morro das Pedras" e tantas coisas boas que vieram na esteira. Na roda de samba, o ritmo vivia.

Era o samba, novamente esquentando corações. Melodias ricas como as de portelenses como Paulo da Portela, Alcides, Aniceto, Manacéa, Mijinha, Alvaiade. Cartola, Carlos Cachaça, Zé Ramos, Nelson Cavaquinho, Nelson Sargento da Mangueira. Silas, Mano Décio e Mestre Fuleiro. Anescar, Noel Rosa de Oliveira (não confundir com o xará de Vila Isabel). Os professores Edgar, Rubens, Ismael, Nilton e Noel da Vila. 

Eram eles que voltavam à boca do povo. E no Rio, o processo acontecia com o renascimento da Lapa, ainda que lá envolvesse dinheiro, bares descolados e uma aparelhagem técnica à la Woodstock. A "nova Lapa", no entanto, apesar de renascer assim, nos trouxe ótimos nomes: Teresa Cristina, Alfredo Del Penho, Pedro Paulo Malta, Pedro Amorim, Pedro Miranda, entre outros.

Mas foi em São Paulo, no ano de 2007, que tudo mudou. O ano começou com um show no Teatro Fecap. Li no jornal: "Terreiro Grande, grupo formado por ex-integrantes do Grêmio Recreativo de Pesquisa e Tradição Morro das Pedras, acompanha Cristina Buarque neste espetáculo do Teatro Fecap". Tomei um susto. Não sabia que o Morro tinha acabada, não sabia que o Terreiro seria a semente das mudanças que viriam daí pra frente.

O show, divinal. O disco, aquele de capa azul com um tamborim, de foramato francamente anticomercial, despertou paixão Brasil afora. Em várias cidades, o "samba de terreiro" (algo ainda mais restrito e específico que o "samba de raiz") ganhou força: Porto Alegre, Uberlândia, Santos, Rio e claro, São Paulo em suas dezenas de quebradas.

Era a era romântica. Presenciar uma roda do Terreiro Grande era uma delícia, algo mágico que levarei em minha mente até o fim de meus dias. São Paulo pulsava samba. Surgiram os @migos do samba.com, grande e representativa agremiação de sambistas de vários costados da capital paulista, que luta pela valorização do samba. Me orgulho de pertencer a este celeiro de bambas.

Foi-se o Terreiro Grande, surgiu o Batalhão de Sambistas, capitaneado pelo gogó dourado Tuco. E o samba seguia conquistando corações, mentes e almas. O disco "Peso é Peso", joia rara, que beleza!, é ouro só. Bem como seu lançamento, num sítio em Atibaia repleto de sambistas, que fim de semana histórico.

E vieram as homenagens a Chico Santana, e surgiu o Programa É Batucada!, o Bloco de Samba Pega o Lenço e Vai. Nasceu o jornal "O Amigo do Samba"...

Minhas armas foram se tornando cada vez mais letais. Colaborando com a revista Carta Capital, pude levar aos mais distantes rincões do Brasil informações sobre o disco do Tuco, do Wilson das Neves, do livro sobre o Estácio de Sá... Mais armas vieram às minhas mãos. Editando a Agenda São Paulo, no site Catraca Livre, é mais espaço pro samba!

E seguimos resistindo, na trincheira. Compondo, cantando, versando, louvando. 

E salve Tia Cida, Cebola, Paulão, Laurinha, Seu Mangueira, Seu Jair e tantos bambas das antigas. E salve a nova geração, que batalha tanto! Favela e seu Anhanguera, Bigode, Timor, rapaziada de Mauá, Terra Brasileira, Glória ao Samba, Samba na Feira, Resgate, Uberlândia e todos que batalham pelo samba. Alexandre do Morro e todos aqueles que participaram deste movimento. Careca, pessoal do Batalhão de Sambistas, Douglas Germano... Aos não citados, mas não olvidados, também dou meu salve.

E avante na luta!!

7 comentários:

Murilo Mendes disse...

Que texto mano! Vamos seguindo! Sinto que estamos mais maduros e cientes do nosso papel. E o que é melhor, respeitando os que pensam diferente.

Vamo que vamo!

Anônimo disse...

belo texto, compadre!

Jéssica Machado disse...

Oi André! Olha, posso dizer que não sou a mesma pessoa de um ano atrás, quando fui passar férias em SP, e conheci uma roda de samba, onde estavam presentes algumas pessoas citadas por vc, como o pessoal do Glória, o Tuco, a amável Noeli, e sinceramente, minha percepção musical foi transformada, me encantei e enfim, me encontrei! Hoje consigo ouvir uma canção e sentir no fundo da alma as palavras de Alberto Lonato, Dona Ivone Lara, Chico Santana, Paulinho da Viola e tantos outros baluartes do SAMBA.

Anônimo disse...

Salve o nosso samba, que NUNCA acabará!

Fernandinho

Artur de Bem disse...

Porra, Piruca!!!

És um monstro!!!

Anônimo disse...

Grande Piruca!!

Cabralzinho está aí.. rsrsrsrs
Parabéns mano

Edinho - Mauá

Sandro o Lona disse...

Na FECAP em 2007 foi incrível, a Cristina estava afiadíssima. Inclusive em ambos os dias do espetáculo. Foi ali que conheci o gogó do Tuco, que na época eu achava que ele tentava imitar o grande Monarco, de maneira contagiante e coerente.
Parabéns a todos que estavam presente nesse magnífico espetáculo em 2007.

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O Couro do Cabrito by André Carvalho is licensed under a Creative Commons Atribuição-Uso Não-Comercial-Vedada a Criação de Obras Derivadas 3.0 Brasil License.
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