MANO DÉCIO DA VIOLA - 100 ANOS
Em seu antológico samba-enredo “Heróis da Liberdade”, parceria com Silas de Oliveira e Manuel Ferreira, que alcançou o modesto 4º lugar no desfile de 1969, Mano Décio da Viola, Décio Antonio Carlos de nascimento, cita alguns vultos importantes de nossa história. Nossos heróis, que lutaram pela nossa liberdade e pela consolidação de nossa nação. Entretanto, a nossa história oficial deixa de lado nomes de pessoas que, através da música popular, conseguiram atingir resultados ainda mais expressivos: eles libertaram nossas mentes da obscuridade, da ignorância, da ditadura dos jabás e enlatados culturais. Conseguiram nos trazer emoção através de melodias singelas e de palavras cativantes. Ao fazerem samba, são os nossos “heróis da liberdade”.
Nosso herói em questão, Mano Décio da Viola, teve em sua vida o que chamamos de “saga do herói”. Nascido na Bahia, em Santo Amaro da Purificação em 14 de julho de 1909, filho do baiano Hermógenes Antonio Maximo, operário da construção civil e da pernambucana Maria Isabel Maximo, foi registrado em Juiz de Fora e batizado somente no Rio de Janeiro.
Pobre, ainda tinha mais 15 irmãos para dividir a escassa comida que tinha à mesa. Para suavizar esse sofrimento, trabalhou desde cedo, buscando água para abastecer os Morros de Santo Antonio e do Castelo, onde residiu. Morou na Mangueira e em Madureira e foi nesses centros irradiadores de samba que travou conhecimento de nosso ritmo que contagiava os morros e subúrbios cariocas. Cansado da perseguição do pai, fugiu de casa e foi vender jornal no Largo da Carioca. Foi aí que se tornou um morador de rua. “Bicho solto”, ia à todos os pagodes que achasse conveniente.
Em Mangueira, no Buraco Quente, conheceu Norberto Vieira Marçal, vulgo Manga, irmão do lendário Armando Marçal. Manga era presidente da Escola de Samba Recreio de Ramos e comandava quarenta garotos jornaleiros. O pequeno e já malandro Décio foi viver com ele.
A música já convivia com sua personalidade. Além de freqüentar o Recreio de Ramos, o rapaz de vinte e poucos anos se fez presente em diversas agremiações: União de Madureira, Rainha das Pretas, União de Vaz Lobo, Unidos da Tamarineira e Unidos da Congonha foram locais que recepcionaram o futuro lendário sambista em seus primeiros passos no mundo do samba.
Cativado por uma melodia que ouvira no cinema, fez seu primeiro samba, no início dos anos 30, colocando uns versos sobre a valsa de Waldteufel. Seu parceiro era o sambista Sete, mas quando o samba foi gravado anos depois por Almirante, os parceiros que apareceram no selo foram Bide e João de Barro (seu nome apareceu como Delson Carlos). À época, era comum vender sambas e parcerias. Vendeu vários e deu alguns para Armando Marçal terminar com Bide. É possível, portanto, que alguns dos clássicos da dupla Bide e Marçal tenha o dedo de Mano Décio. Foi nessa época, aliás, que ganhou o apelido que levaria para o resto de sua vida (o sambista Magno quem o apelidou). Foi nessa época, também, que perdeu a visão de um dos olhos quando uma lata de creolina que carregava estourou e atingiu sua face. Na ocasião compôs o samba “Cego e surdo”.
Cansado de rodar por várias escolas de samba, chegou a Escola de Samba Prazer da Serrinha por volta de 1933, 1934. Após ser aprovado por Alfredo Costa, o “dono da escola”, pôde lá permanecer. Lá, fez belos sambas de terreiro com Mario Feliciano, o Manula, Delfino (principal compositor junto com Mano Décio e diretor de harmonia da escola), Carlinhos Bem-te-vi e outros. Na época, os sambas possuíam apenas a primeira parte e ele compôs alguns belos versos como “Sonhei, sonhei / Comovido fiquei / Por alguém que eu amei / Eu de alegria chorei / Eu chorei”.
O ano de 1935 deve entrar para história de nossa música popular. Foi nesse ano que ele levou para a sua escola o grande compositor Silas de Oliveira. Antes eles já haviam composto o samba Meu Grande Amor (Meu grande amor / Vem consolar a minha dor / Você ainda é minha vida / É o meu calor / Eu lhe amo minha querida / Eu sou o seu cantor). Foi uma época onde o samba pôde levar a felicidade a nosso herói. Se antes as sofreguidões da vida consumiam a maior parte de seu tempo, agora esse tempo era ocupado com sambas, peixadas e farras homéricas.
Quando começou a Segunda Guerra Mundial, o Prazer da Serrinha fechou as portas. Mano Décio, então foi pra Portela. Retornou assim que a sua escola do coração voltou a desfilar, ainda em 1945. Nesse Carnaval, os sambistas mais jovens já estavam bastante incomodados com os mandos e desmandos do “ditador” Alfredo Costa. No ano seguinte, Antonio Caetano, fundador da Portela, levou para o Prazer da Serrinha seu enredo “A Conferência de São Francisco” que fora rejeitado pela agremiação de Oswaldo Cruz. Silas de Oliveira e Mano Décio fizeram o samba-enredo (considerado por Mano Décio pioneiro ao ligar o samba com motivos históricos ao enredo). Porém, na hora do desfile, Alfredo Costa pediu para que os componentes cantassem o samba de terreiro Alto da Colina, de Albano. O resultado foi um desfile desencontrado, sem harmonia com cada ala cantando um samba diferente. O 11º lugar foi até bom pelo desastre que foi. Mano Décio sentiu o golpe e chorou.
Diante de tais acontecimentos, uma nova escola era a ambição daqueles que foram violados em plena avenida. Em 1947, o desfile do Prazer da Serrinha ainda foi da dupla Silas/ Mano Décio (dessa vez o samba foi desfilado), mas o surgimento do Império Serrano era inevitável. Assim, no decorrer desse mesmo ano, surgiu o Grêmio Recreativo Escola de Samba Império Serrano, o menino de 47, Reizinho de Madureira.
A história do Império Serrano confunde-se com a história de Mano Décio. No primeiro desfile, em 48, o samba-enredo “Antonio Castro Alves” foi de Comprido, mas a partir daí, foram raros os anos em que o nome de Mano Décio não estivesse presente. Em 1949, compôs o antológico “Exaltação à Tiradentes”. Primeiro ele tentou em três oportunidades fazer um samba com Silas, todos reprovados. Alguns dias depois, sonhou com uma melodia. Não foi trabalhar, fez um peixe e firmou a primeira. Lembrou-se da segunda do Penteado e a encaixou. Estanislau Silva entrou de lambuja.
De 1949, quando fez Tiradentes, até 1964 quando se retirou provisoriamente para a Portela, Mano Décio deixou de emplacar seu samba na avenida apenas em 53 e 54. Alcançou o título em seis oportunidades (49, 50, 51, 55, 56 e 60). Além de Silas de Oliveira, foi parceiro de Penteado, Estanislau Silva, Molequinho, Chocolate, Abílio Martins, Aidno Sá, Ramon Russo e David do Pandeiro.
Como as histórias de amor (como foi a relação de Mano Décio e o Império) sempre têm os momentos de crise, em 1964, Mano Décio brigou com a diretoria do Império e se mandou para a Portela, onde ficou até 1968. Após o Carnaval de 1964, vencido pela Portela, escutou-se em Madureira uma letra de Mano Décio sobre a música do samba-enredo da Portela do ano que dizia assim: “como é bom ganhar/ como é bom ganhar/ Não adianta chorar”. Não pegou bem na Serrinha.
De volta ao Império em 1968, concorreu pela primeira e única vez com Silas de Oliveira. O enredo era “Pernambuco, Leão do Norte” e ele fez uma bela parceria com Jorginho Pessanha, recém-egresso à Escola. Mas, deu Silas. Em 1969, fez seu último samba-enredo para o Império. Parceria com Silas e Manuel Ferreira, compôs o antológico “Heróis da Liberdade”. Também foi o último de Silas, que seria boicotado sistematicamente nas disputas de samba-enredo do Império nos anos seguintes. Esse samba (Heróis da Liberdade) ficou apenas em quarto lugar, mas passou para história. Na época deu rolo com a ditadura, que não gostou de algumas referências aos militares.
Nos anos 70, Mano Décio finalmente obteve a glória de gravar alguns LPs, coisa que muito sambista genial morreu sem fazer. O primeiro, de 1973, saiu como brinde de Natal de uma metalúrgica e é hoje uma raridade. No ano seguinte, gravou “Capítulo Maior da História do Samba”, pela Tapecar. Em 1976, lançou “ O Legendário Mano Décio da Viola”, pela Polydor. Os três álbuns seguintes foram lançados pela CBS: “O Imperador” em 1978, “Mano Décio”, em 1979 e “Mano Décio Apresenta a Velha Guarda do Império” em 1980.
Além de ter registrado sua voz para a posteridade, ele também foi gravado por grandes nomes de nossa música como: Almirante, Abílio Martins, Gilberto Alves, Roberto Silva, Chico Buarque, Elis Regina, Jorginho do Império, Jair Rodrigues, Martinho da Vila, João Bosco, João Nogueira, Paulinho da Viola, Jorge Goulart, Mestre Marçal, entre outros.
Em 18 de outubro de 1984, foi para o Reino da Glória pontear sua viola com seu parceiro Silas, que já tinha partido no ano de 1972. Hoje, cem anos após seu nascimento, rendemos nossa singela homenagem a ele.
Discografia:
Mano Décio da Viola (1973)
Capítulo Maior da História do Samba (1974)
O Legendário Mano Décio da Viola (1976)
O Imperador (1978)
Mano Décio (1979)
Mano Décio apresenta a Velha Guarda do Império (1980)
Sambas emplacados na avenida:
No Prazeres da Serrinha
1946 - Paz Universal (Mano Décio da Viola - Silas de Oliveira) - 11º lugar (impedido de ser cantado na hora H)
1947 - Os Bandeirantes (Mano Décio da Viola - Silas de Oliveira) - 7º lugar
No Império Serrano
1949 - Exaltação a Tiradentes (Mano Décio da Viola - Penteado - Estanislau Silva) - 1º lugar
1950 - Batalha Naval de Riachuelo (Mano Décio da Viola - Penteado - Molequinho) - 1º lugar
1951 - 61 anos de República (Silas de Oliveira - Mano Décio da Viola) - 1º lugar
1952 - Homenagem a Medicina (Mano Décio da Viola - Penteado - Molequinho) - anulado
1955 - Exaltação a Duque de Caxias (Mano Décio da Viola- Silas de Oliveira) - 1º lugar
1956 - O caçador de esmeraldas (Mano Décio da Viola - Silas de Oliveira) - 1º lugar
1957 - Exaltação a D. João VI (Mano Décio da Viola - Silas de Oliveira) - 2º lugar
1958 - Exaltação a Bárbara Heliodora (Mano Décio da Viola - Silas de Oliveira - Ramon Russo) - 2º lugar
1959 - Brasil Holandês (Mano Décio da Viola - Chocolate - Abílio Martins) - 3º lugar
1960 - Medalhas e brasões (Mano Décio da Viola - Silas de Oliveira) - 1º lugar
1961 - Movimentos revolucionários do Brasil (Mano Décio da Viola - Aidno Sá) - 4º lugar
1962 - Rio dos Vice-Reis (Mano Décio da Viola - Aidno Sá - David do Pandeiro) - 2º lugar
1963 - Rio de Ontem e Hoje (Ala dos Compositores) - 3º lugar
1969 - Heróis da Liberdade (Mano Décio da Viola - Silas de Oliveira - Manoel Ferreira) - 4ºlugar
Fontes de consulta:
Livros:
CABRAL, Sérgio. As escolas de samba do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, Editora Lumiar, 1996
TINHORÃO, José Ramos. Pequena História da Música Popular - Da modinha à canção de protesto. Petrópolis, Vozes, 1974
SILVA, Marília Trindade Barboza da, & OLIVEIRA FILHO, Arthur L. de. Silas de Oliveira, do Jongo ao Samba-enredo. Rio de Janeiro, Funarte, 1981
VALENÇA, Rachel & VALENÇA, Suetônio. Serra, Serrinha, Serrano. O Império do Samba. Rio de Janeiro, José Olympio, 1981
Fascículos:
CABRAL, Sérgio. História das Escolas de Samba - vol. 7. Rio de Janeiro, Rio Gráfica e Editora, 1976
VÁRIOS AUTORES. Nova História da Música Popular Brasileira - vol. 21. Silas de Oliveira/ Mano Décio da Viola. São Paulo. Abril Cultural, 1977
VÁRIOS AUTORES. História da Música Popular Brasileira - Série Grandes Compositores - Silas De Oliveira / Mano Décio Da Viola / Dona Ivone Lara; Abril Cultural, 1983
Em seu antológico samba-enredo “Heróis da Liberdade”, parceria com Silas de Oliveira e Manuel Ferreira, que alcançou o modesto 4º lugar no desfile de 1969, Mano Décio da Viola, Décio Antonio Carlos de nascimento, cita alguns vultos importantes de nossa história. Nossos heróis, que lutaram pela nossa liberdade e pela consolidação de nossa nação. Entretanto, a nossa história oficial deixa de lado nomes de pessoas que, através da música popular, conseguiram atingir resultados ainda mais expressivos: eles libertaram nossas mentes da obscuridade, da ignorância, da ditadura dos jabás e enlatados culturais. Conseguiram nos trazer emoção através de melodias singelas e de palavras cativantes. Ao fazerem samba, são os nossos “heróis da liberdade”.
Nosso herói em questão, Mano Décio da Viola, teve em sua vida o que chamamos de “saga do herói”. Nascido na Bahia, em Santo Amaro da Purificação em 14 de julho de 1909, filho do baiano Hermógenes Antonio Maximo, operário da construção civil e da pernambucana Maria Isabel Maximo, foi registrado em Juiz de Fora e batizado somente no Rio de Janeiro.
Pobre, ainda tinha mais 15 irmãos para dividir a escassa comida que tinha à mesa. Para suavizar esse sofrimento, trabalhou desde cedo, buscando água para abastecer os Morros de Santo Antonio e do Castelo, onde residiu. Morou na Mangueira e em Madureira e foi nesses centros irradiadores de samba que travou conhecimento de nosso ritmo que contagiava os morros e subúrbios cariocas. Cansado da perseguição do pai, fugiu de casa e foi vender jornal no Largo da Carioca. Foi aí que se tornou um morador de rua. “Bicho solto”, ia à todos os pagodes que achasse conveniente.
Em Mangueira, no Buraco Quente, conheceu Norberto Vieira Marçal, vulgo Manga, irmão do lendário Armando Marçal. Manga era presidente da Escola de Samba Recreio de Ramos e comandava quarenta garotos jornaleiros. O pequeno e já malandro Décio foi viver com ele.
A música já convivia com sua personalidade. Além de freqüentar o Recreio de Ramos, o rapaz de vinte e poucos anos se fez presente em diversas agremiações: União de Madureira, Rainha das Pretas, União de Vaz Lobo, Unidos da Tamarineira e Unidos da Congonha foram locais que recepcionaram o futuro lendário sambista em seus primeiros passos no mundo do samba.
Cativado por uma melodia que ouvira no cinema, fez seu primeiro samba, no início dos anos 30, colocando uns versos sobre a valsa de Waldteufel. Seu parceiro era o sambista Sete, mas quando o samba foi gravado anos depois por Almirante, os parceiros que apareceram no selo foram Bide e João de Barro (seu nome apareceu como Delson Carlos). À época, era comum vender sambas e parcerias. Vendeu vários e deu alguns para Armando Marçal terminar com Bide. É possível, portanto, que alguns dos clássicos da dupla Bide e Marçal tenha o dedo de Mano Décio. Foi nessa época, aliás, que ganhou o apelido que levaria para o resto de sua vida (o sambista Magno quem o apelidou). Foi nessa época, também, que perdeu a visão de um dos olhos quando uma lata de creolina que carregava estourou e atingiu sua face. Na ocasião compôs o samba “Cego e surdo”.
Cansado de rodar por várias escolas de samba, chegou a Escola de Samba Prazer da Serrinha por volta de 1933, 1934. Após ser aprovado por Alfredo Costa, o “dono da escola”, pôde lá permanecer. Lá, fez belos sambas de terreiro com Mario Feliciano, o Manula, Delfino (principal compositor junto com Mano Décio e diretor de harmonia da escola), Carlinhos Bem-te-vi e outros. Na época, os sambas possuíam apenas a primeira parte e ele compôs alguns belos versos como “Sonhei, sonhei / Comovido fiquei / Por alguém que eu amei / Eu de alegria chorei / Eu chorei”.
O ano de 1935 deve entrar para história de nossa música popular. Foi nesse ano que ele levou para a sua escola o grande compositor Silas de Oliveira. Antes eles já haviam composto o samba Meu Grande Amor (Meu grande amor / Vem consolar a minha dor / Você ainda é minha vida / É o meu calor / Eu lhe amo minha querida / Eu sou o seu cantor). Foi uma época onde o samba pôde levar a felicidade a nosso herói. Se antes as sofreguidões da vida consumiam a maior parte de seu tempo, agora esse tempo era ocupado com sambas, peixadas e farras homéricas.
Quando começou a Segunda Guerra Mundial, o Prazer da Serrinha fechou as portas. Mano Décio, então foi pra Portela. Retornou assim que a sua escola do coração voltou a desfilar, ainda em 1945. Nesse Carnaval, os sambistas mais jovens já estavam bastante incomodados com os mandos e desmandos do “ditador” Alfredo Costa. No ano seguinte, Antonio Caetano, fundador da Portela, levou para o Prazer da Serrinha seu enredo “A Conferência de São Francisco” que fora rejeitado pela agremiação de Oswaldo Cruz. Silas de Oliveira e Mano Décio fizeram o samba-enredo (considerado por Mano Décio pioneiro ao ligar o samba com motivos históricos ao enredo). Porém, na hora do desfile, Alfredo Costa pediu para que os componentes cantassem o samba de terreiro Alto da Colina, de Albano. O resultado foi um desfile desencontrado, sem harmonia com cada ala cantando um samba diferente. O 11º lugar foi até bom pelo desastre que foi. Mano Décio sentiu o golpe e chorou.
Diante de tais acontecimentos, uma nova escola era a ambição daqueles que foram violados em plena avenida. Em 1947, o desfile do Prazer da Serrinha ainda foi da dupla Silas/ Mano Décio (dessa vez o samba foi desfilado), mas o surgimento do Império Serrano era inevitável. Assim, no decorrer desse mesmo ano, surgiu o Grêmio Recreativo Escola de Samba Império Serrano, o menino de 47, Reizinho de Madureira.
A história do Império Serrano confunde-se com a história de Mano Décio. No primeiro desfile, em 48, o samba-enredo “Antonio Castro Alves” foi de Comprido, mas a partir daí, foram raros os anos em que o nome de Mano Décio não estivesse presente. Em 1949, compôs o antológico “Exaltação à Tiradentes”. Primeiro ele tentou em três oportunidades fazer um samba com Silas, todos reprovados. Alguns dias depois, sonhou com uma melodia. Não foi trabalhar, fez um peixe e firmou a primeira. Lembrou-se da segunda do Penteado e a encaixou. Estanislau Silva entrou de lambuja.
De 1949, quando fez Tiradentes, até 1964 quando se retirou provisoriamente para a Portela, Mano Décio deixou de emplacar seu samba na avenida apenas em 53 e 54. Alcançou o título em seis oportunidades (49, 50, 51, 55, 56 e 60). Além de Silas de Oliveira, foi parceiro de Penteado, Estanislau Silva, Molequinho, Chocolate, Abílio Martins, Aidno Sá, Ramon Russo e David do Pandeiro.
Como as histórias de amor (como foi a relação de Mano Décio e o Império) sempre têm os momentos de crise, em 1964, Mano Décio brigou com a diretoria do Império e se mandou para a Portela, onde ficou até 1968. Após o Carnaval de 1964, vencido pela Portela, escutou-se em Madureira uma letra de Mano Décio sobre a música do samba-enredo da Portela do ano que dizia assim: “como é bom ganhar/ como é bom ganhar/ Não adianta chorar”. Não pegou bem na Serrinha.
De volta ao Império em 1968, concorreu pela primeira e única vez com Silas de Oliveira. O enredo era “Pernambuco, Leão do Norte” e ele fez uma bela parceria com Jorginho Pessanha, recém-egresso à Escola. Mas, deu Silas. Em 1969, fez seu último samba-enredo para o Império. Parceria com Silas e Manuel Ferreira, compôs o antológico “Heróis da Liberdade”. Também foi o último de Silas, que seria boicotado sistematicamente nas disputas de samba-enredo do Império nos anos seguintes. Esse samba (Heróis da Liberdade) ficou apenas em quarto lugar, mas passou para história. Na época deu rolo com a ditadura, que não gostou de algumas referências aos militares.
Nos anos 70, Mano Décio finalmente obteve a glória de gravar alguns LPs, coisa que muito sambista genial morreu sem fazer. O primeiro, de 1973, saiu como brinde de Natal de uma metalúrgica e é hoje uma raridade. No ano seguinte, gravou “Capítulo Maior da História do Samba”, pela Tapecar. Em 1976, lançou “ O Legendário Mano Décio da Viola”, pela Polydor. Os três álbuns seguintes foram lançados pela CBS: “O Imperador” em 1978, “Mano Décio”, em 1979 e “Mano Décio Apresenta a Velha Guarda do Império” em 1980.
Além de ter registrado sua voz para a posteridade, ele também foi gravado por grandes nomes de nossa música como: Almirante, Abílio Martins, Gilberto Alves, Roberto Silva, Chico Buarque, Elis Regina, Jorginho do Império, Jair Rodrigues, Martinho da Vila, João Bosco, João Nogueira, Paulinho da Viola, Jorge Goulart, Mestre Marçal, entre outros.
Em 18 de outubro de 1984, foi para o Reino da Glória pontear sua viola com seu parceiro Silas, que já tinha partido no ano de 1972. Hoje, cem anos após seu nascimento, rendemos nossa singela homenagem a ele.
Discografia:
Mano Décio da Viola (1973)
Capítulo Maior da História do Samba (1974)
O Legendário Mano Décio da Viola (1976)
O Imperador (1978)
Mano Décio (1979)
Mano Décio apresenta a Velha Guarda do Império (1980)
Sambas emplacados na avenida:
No Prazeres da Serrinha
1946 - Paz Universal (Mano Décio da Viola - Silas de Oliveira) - 11º lugar (impedido de ser cantado na hora H)
1947 - Os Bandeirantes (Mano Décio da Viola - Silas de Oliveira) - 7º lugar
No Império Serrano
1949 - Exaltação a Tiradentes (Mano Décio da Viola - Penteado - Estanislau Silva) - 1º lugar
1950 - Batalha Naval de Riachuelo (Mano Décio da Viola - Penteado - Molequinho) - 1º lugar
1951 - 61 anos de República (Silas de Oliveira - Mano Décio da Viola) - 1º lugar
1952 - Homenagem a Medicina (Mano Décio da Viola - Penteado - Molequinho) - anulado
1955 - Exaltação a Duque de Caxias (Mano Décio da Viola- Silas de Oliveira) - 1º lugar
1956 - O caçador de esmeraldas (Mano Décio da Viola - Silas de Oliveira) - 1º lugar
1957 - Exaltação a D. João VI (Mano Décio da Viola - Silas de Oliveira) - 2º lugar
1958 - Exaltação a Bárbara Heliodora (Mano Décio da Viola - Silas de Oliveira - Ramon Russo) - 2º lugar
1959 - Brasil Holandês (Mano Décio da Viola - Chocolate - Abílio Martins) - 3º lugar
1960 - Medalhas e brasões (Mano Décio da Viola - Silas de Oliveira) - 1º lugar
1961 - Movimentos revolucionários do Brasil (Mano Décio da Viola - Aidno Sá) - 4º lugar
1962 - Rio dos Vice-Reis (Mano Décio da Viola - Aidno Sá - David do Pandeiro) - 2º lugar
1963 - Rio de Ontem e Hoje (Ala dos Compositores) - 3º lugar
1969 - Heróis da Liberdade (Mano Décio da Viola - Silas de Oliveira - Manoel Ferreira) - 4ºlugar
Fontes de consulta:
Livros:
CABRAL, Sérgio. As escolas de samba do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, Editora Lumiar, 1996
TINHORÃO, José Ramos. Pequena História da Música Popular - Da modinha à canção de protesto. Petrópolis, Vozes, 1974
SILVA, Marília Trindade Barboza da, & OLIVEIRA FILHO, Arthur L. de. Silas de Oliveira, do Jongo ao Samba-enredo. Rio de Janeiro, Funarte, 1981
VALENÇA, Rachel & VALENÇA, Suetônio. Serra, Serrinha, Serrano. O Império do Samba. Rio de Janeiro, José Olympio, 1981
Fascículos:
CABRAL, Sérgio. História das Escolas de Samba - vol. 7. Rio de Janeiro, Rio Gráfica e Editora, 1976
VÁRIOS AUTORES. Nova História da Música Popular Brasileira - vol. 21. Silas de Oliveira/ Mano Décio da Viola. São Paulo. Abril Cultural, 1977
VÁRIOS AUTORES. História da Música Popular Brasileira - Série Grandes Compositores - Silas De Oliveira / Mano Décio Da Viola / Dona Ivone Lara; Abril Cultural, 1983
Internet:
Este material foi produzido para ser distribuído na homenagem aos 100 anos do nascimento do Mano Décio, realizada pelo Projeto Samba de Terreiro de Mauá.
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